Listas de leitura são penelopianas. Porque são feitas e, no decorrer do ano, desfeitas. Quando um livro interessável é lançado, no Brasil ou no exterior, os olhos coçam e as mãos, se Candice Marques de Lima não segurá-las, começam a sacar a carteira do bolso. Então, como possivelmente as de outras pessoas, a minha lista para 2019 é provisória.
Estou relendo trechos de “Entre a Lagoa e O Mar — Reminiscências” (Editora Bem-Te-Vi, 416 páginas), as memórias de Fernando Pedreira, e torço, de mãos postas, para que lance o segundo volume (se não publicar, penso até em rezar para que não entre no céu e fique no purgatório até os originais serem encontrados e editados). Não consegui entender porque o livro não recebeu fortes comentários na imprensa. Porque se trata de uma obra de rara excelência de um jornalista e escritor de sólida formação. Ele expõe sua ação e, para tanto, resgata a história do Brasil e do jornalismo patropi no século 20. Delícia maior não há.
Uma de minhas atividades não profissionais é admirar pássaros e, às vezes, fotografá-los no meu quintal. Aprecio olhar sanhaços, chocas-barradas, choquinhas lisas, saíra-macaco (saíra-amarela), saí-azul, assobiador, cambacicas, fim fim, bem-te-vis, sabiás e periquitos comendo banana e mamão. Até pica-paus e pardais aparecem pra comer frutas. Quando preciso de informações rápidas e certeiras, consulto Nunes D’Acosta, um dos melhores fotógrafos de pássaros do país. Para não sacrificar a enciclopédia Nunes — que o país conhece como Nunespédia —, vou ler “Pássaros do Brasil — Vida e Costumes dos Pássaros do Brasil” (Itatiaia, 313 páginas), de Eurico Santos.
Tiranos querem ser ilustrados?
Se a Filosofia tem um santo — uma matriz —, este é Aristóteles (Platão fica próximo, quiçá como santo-júnior). Pois a Editora Autêntica nos presenteia com “Sobre a Arte Poética” (160 páginas), do filósofo grego, numa edição bilíngue. Antônio Queirós Campos e Antônio Mattoso traduziram o texto do original. Vale saudar a Editora É Realizações, que está devolvendo a obra de José Guilherme Merquior às livrarias. “De Anchieta a Euclides — Breve História da Literatura Brasileira” (400 páginas) é um livro magnífico.
O americano Mark Lilla é citado, corretamente, como historiador e cientista político. Deveria ser acrescentado: filósofo. Quiçá um filósofo político. “A Mente Imprudente — Os Intelectuais na Atividade Política” (Record, 195 páginas, tradução de Clóvis Marques) contém um ensaio extraordinário, “A sedução de Siracusa”. Conta que Díon pediu ao seu mestre, Platão, que fosse a Siracusa para orientar Dionísio, o Jovem, que “pretendia” ser um rei-filósofo. Mesmo relutante, até por saber que os homens do poder não dão muita importância àqueles que pensam para além da circunstância, o pensador grego decidiu acompanhar Díon. Percebeu, de cara, que Dionísio não dava a mínima para o pensamento verdadeiro, para a iluminação da política. Por certo, queria apenas uma caricatura de ilustração para manter o poder. Depois, Díon convenceu Platão a visitar Siracusa para, mais uma vez, “orientar” Dionísio. A visita deu em nada. Mais tarde, Díon, por meio de um golpe, chegou ao poder. Mas acabou assassinado. Por que, mesmo tendo dúvidas, Platão decidiu ser conselheiro do rei? É o que Mark Lilla explica. “A Mente Naufragada — Sobre o Espírito Reacionário” (Record, 126 páginas, tradução de Clóvis Marques) e “O Progressista de Ontem e o do Amanhã — Desafios da Democracia Liberal no Mundo Pós-Políticas Identitárias” (Companhia das Letras, 104 páginas, tradução de Berilo Vargas), de Mark Lilla, entram na minha lista para leituras frequentes.
Apesar de criticada, a democracia não sai da moda, ao menos nos livros. “Como as Democracias Morrem” (Zahar, 272 páginas, tradução de Renato Aguiar), de Daniel Ziblatt e Steven Levitsky, professores de Harvard, fez sucesso em 2018. Mas o livro que vai para minha lista é “Democracia” (Record, 477 páginas, tradução de Clóvis Marques), organizado por Robert Darnton e Olivier Duhamel. São ensaios. Estão na minha mira os artigos “Face ao totalitarismo”, de Martin Malia e Luc Ferry (cada um escreveu um ensaio), e “Democracia social em crise”, de Daniel Patrick Moynihan, e “O Estado Previdenciário”, de Daniel Cohen. Há artigos de vários outros autores, como Richard Rorty, Ronald Dworkin, Michael Löwy e Amartya Sen.
Isaiah Berlin é um grande vulgarizador da Filosofia que entendia como poucos de literatura. Explica com imensa clareza a obra dos filósofos Vico e, até, de Marx. Na minha lista consta um livro curto do filósofo britânico, “Uma Mensagem Para o Século XXI” (Âyiné, 66 páginas, tradução de André Bezamat). Vou ler, mais uma vez, alguns dos ensaios de “Estudos Sobre a Humanidade — Uma Antologia de Ensaios” (Companhia das Letras, 720 páginas, tradução de Rosaura Eichemberg). Vou revirar os ensaios sobre Roosevelt, Churchill e Anna Akhmátova.
No delicioso “Do Palácio ao Bordel — Crônicas e Segredos de um Jornalista Brasileiro em Londres” (Grua, 238 páginas), de Antonio Carlos Seidl, há uma entrevista com Isaiah Berlin. Ao tratar as utopias como perigosas, o filósofo afirma: “Não podemos reescrever a história. Todavia não quero abandonar a crença de que não seja um sonho utópico imaginar um mundo como uma colcha de retalhos de muitas cores, cada um deles desenvolvendo sua própria identidade cultural e tolerante em relação às outras”. De cara, o filósofo disse: “Você é o primeiro brasileiro que conheço pessoalmente”.
Dos filósofos vivos, ao menos um é obrigatório, o britânico John Gray (assim como Roger Scruton). Por isso listo “A Alma da Marionete — Um Breve Ensaio Sobre a Liberdade Humana” (Record, 126 páginas, tradução de Clóvis Marques). Os livros menores do autor são, em geral, de uma profundidade rara. Ingleses têm o hábito de brilhar nos ensaios, com a vantagem de, ao contrário dos alemães, escreverem com o máximo de clareza.
O século 21 pertence, com seus 18 anos — um adolescente que está se tornando adulto —, à história do século 20. O século atual ainda não conseguiu descolar do século passado. Por isso, nada mais saudável do que ler “Pensando o Século XX” (Objetiva, 431 páginas, tradução de Otacílio Nunes), de Tony Judt. O livro foi publicado graças ao empenho do historiador Timothy Snyder. A doença Ela matou Judt, historiador notável (grande conhecedor de Filosofia, escreveu um livro que demole a reputação de alguns filósofos franceses, como Sartre e Merleau-Ponty), com apenas 62 anos.
Stephen Greenblatt consagrou-se como explicador notável da obra de Skakespeare. Da obra e do homem. Formado em Yale, com pós-graduação em Cambridge, prova que não é escravo do vate e dramaturgo britânico, por isso escreveu um livro que figura na minha lista na primeira fila, talvez na segunda: “Ascensão e Queda de Adão e Eva” (Companhia das Letras, 374 páginas, tradução de Donaldson M. Garschagen). Não sou religioso, mas religião me interessa como um dos mais importantes fenômenos culturais da história. A obra de Greenblatt não é, evidentemente, sobre religião. Ou melhor, é, mas vai além.
Biografias de Mário de Andrade e Carlos Lacerda
A Sextante deve publicar a biografia de Mário de Andrade escrita pelo jornalista Jason Tércio. Ainda não tem título, mas promete revelações. A homossexualidade (ou bissexualidade) do autor de “Macunaíma” sempre assustou biógrafos. Ou melhor, os pesquisadores de sua vida, alertados de que a família poderia processá-los, sempre tangenciaram o assunto. Mas, se a homo ou a bissexualidade do poeta de “Pauliceia Desvairada” é apenas um aspecto de sua vida, por que não contar o que se pode contar? Aí é que está o problema. Uma biografia não pode excluir a vida íntima e a sexualidade é central na vida dos indivíduos. Jason Tércio, em entrevistas, afirma que tem informações novas a apresentar sobre o chefão da Semana de Arte Moderna de 1922, inclusive sobre sua sexualidade. Enquanto o livro não chega, o leitor pode se deliciar com o ótimo “Eu Sou Trezentos — Mário de Andrade: Vida de Obra” (Edições de Janeiro, 256 páginas), de Eduardo Jardim. É provável que a crítica não tenha percebido, ao menos não de maneira ampla, a excelência deste livro. Friso que estou na primeira fila para ler a obra de Jason Tércio, um pesquisador de primeira linha. Quero saber, sobretudo, como Mário de Andrade se tornou uma espécie de orientador cultural de uma geração de prosadores e poetas sensacionais.
Se o jornalista Mário Magalhães lançar a biografia de Carlos Lacerda, o político brasileiro que namorou as atrizes Shirley MacLaine, irmã de Warren Beatty, e Maria Fernanda, filha de Cecília Meirelles, eu direi: “Parem as máquinas, se ainda existirem máquinas, que eu vou ler o livro sobre o ‘demolidor de presidentes’”. O livro sairá pela Companhia das Letras. Há uma biografia escrita pelo brasilianista John W. F. Dulles, “Carlos Lacerda — A Vida de um Lutador”. Não deixa de ser detalhada, mas falta-lhe alma. A história da suposta homossexualidade do político é tratada en passant e de maneira nada esclarecedora. Talvez porque não é possível apresentar fatos cabais. Se o americano é um pesquisador criterioso, Mário Magalhães, autor de uma biografia seminal de Carlos Marighella, é um repórter notável. É muito provável que teremos, a partir de seu escrutínio, um Carlos Lacerda mais nuançado.
Estou de olho na biografia que Julio Maria, o notável crítico de música do “Estadão” e biógrafo de Elis Regina, está escrevendo de Ney Matogrosso. A Tordesilhas vai publicar a biografia de Luiz Melodia, de Toninho Vaz. “Dona Ivone Lara — A Primeira-Dama do Samba” (Sonora Editora, 230 páginas), de Lucas Nobile, está na cabeceira de minha lista. Talvez leia os livros de Mila Burns e Katia Santos sobre Ivone Lara. Não sei se vou ler, mas estou curioso com o livro “Raphael Rabello — O Violão em Erupção” (Editora 34, 352 páginas), de Lucas Nobile.
Ana Lima Cecilio certamente pretende resgatar uma Hilda Hilst que nós poucos conhecemos. A biografia de Samuel Wainer, escrita por Mariana Filgueiras, deve sair em 2019. Estou na fila, com minha lista penelopiana já desmanchando. Fernando Morais promete as memórias de Lula da Silva para o próximo ano. Estou na fila também, porque, apesar dos pesares, o petista é um grande político. A sua é uma grande história. Os três livros sairão pela Companhia das Letras.
Daqui a 100 anos, Lênin, assim como Stálin, que se tornará um clone piorado de Gengis Khan, será um rodapé na história. Os dois, como Madame de Stäel, mas não o café e Balzac, passarão. Mas o imenso Aleksandr Herzen persistirá como um grande escritor e memorialista. No livro “Pensadores Russos” (Companhia das Letras, 320 páginas, tradução de Carlos Eugênio Marcondes de Moura), o filósofo britânico Isaiah Berlin escreveu belas páginas sobre suas ideias e comportamento. A Editora Âyiné promete publicar, em 2019, “From the Other Shore”, de Herzen. Antes de as máquinas pararem, eu já estarei lendo o livro. Frise-se que Lênin foi influenciado por Herzen, mas, esclareço, não nos aspectos autoritários, porque o escritor era libertário.
Varlam Chalámov e James Joyce
Caetano Galindo, que parece uma máquina de traduzir — e máquina não é, porque Tradukka e Google Tradutor “traduzem” muito mal, apesar de úteis —, põe em Português o teatro e a poesia de James Joyce. O escritor irlandês era bom mesmo na arte do conto e do romance, que, por certo, reinventou. Mas quem aprecia sua literatura, sua arte tão diversa de tudo quanto há, certamente vai voltar os olhos para a edição da Companhia das Letras. Eu, pelo menos, vou, e com prazer. Um Joyce menor é sempre maior do que alguns escritores.
Li os “Contos de Kolimá” (primeiro volume), de Varlam Chalámov. Para 2019, entram na minha lista os demais volumes: “A Margem Esquerda”, “O Artista da Pá”, “Ensaios Sobre o Mundo do Crime” e “A Ressurreição do Lariço”. A edição da Editora 34 é caprichada, com traduções de primeira linha de, entre outros, Cecília Rosas, Daniela Mountian, Denise Sales, Elena Vasilevich e Lucas Simone. A obra é uma radiografia literária sobre a vida no Gulag soviético. No primeiro volume, “Contos de Kolimá”, conta-se a morte do poeta Óssip Mandelstam (e muito mais). Os livros — ou o livro — são verdadeiros documentos e, como tais, são usados por historiadores do gabarito de Anne Applebaum, autora de um livro fundamental sobre o inferno criado na Terra por Stálin: “Gulag — Uma História dos Campos de Prisioneiros Soviéticos”.
“El Vértigo” (Galaxia Gutenberg/Círculo dos Lectores, 857 páginas, tradução de Fernando Gutiérrez), de Evgenia Ginzburg, está entre minhas prioridades. A autora era filiada ao Partido Comunista e, mesmo assim, foi presa em 1937. Ficou 18 anos — uma vida — no Gulag de Stálin. O livro começou a ser escrito em 1959 e, quando a autora morreu, em 1977, não havia sido publicado na União Soviética. Mas circulou no país de maneira clandestina.
“Esclavos de la Libertad — Los Archivos Literarios del KGB” (Galaxia Gutenberg/Círculo de Lectores, 555 páginas, tradução de Ricard Altés Molins), de Vitali Shentalinski. O jornalista e pesquisador foi o primeiro a ter acesso aos arquivos literários do KGB. Ele conseguiu “resgatar valiosos manuscritos e documentos relacionados com a vida de notáveis russos” como Óssip Mandelstam, Platónov, Marina Tsvetáieva, Maksim Górki, Anna Akhmátova, Bábel, Bulgákov, Boris Pilniak e Boris Pasternak. São três volumes. Tenho apenas o primeiro. Trata-se de uma obra que a Editora 34, que publica escritores russos com alta qualidade, deveria publicar.
Como deixar de ler “Poesia Cubana — Do Século XIX à Atualidade” (Editora Demônio Negro), com organização e tradução de Jorge Henrique Bastos? Lezama Lima e Severo Sarduy são poetas extraordinários. Lezama Lima é a verdadeira Revolução Cubana de todos os anos. A eterna.
A Friboi, que se tornou JBS e virou transnacional, nasceu em Goiás. Por isso, e por tantas outras coisas, merece a palavra imperdível o livro que Raquel Landim vai publicar pela Editora Intrínseca. O tradutor Daniel Dago (fonte seminal para lançamentos de 2019) frisa que o título não está definido. A Planeta vai publicar as memórias de Rodrigo Janot.
Vicente Huidobro e a Guerra Civil Espanhola
O maior poeta chileno, sabem os cultores da poesia de qualidade, é Vicente Huidobro (1893-1948). Se é assim, por que Pablo Neruda é mais conhecido e até ganhou o Prêmio Nobel de Literatura? Simples: a patota comunista vulgarizou seu nome e sua poesia pelos quatro cantos do mundo. E, de fato, o tema amor fortaleceu sua poesia e assegurou repercussão transnacional. Pois a Editora Martelo, de Goiás, promete resgatar Huidobro (para além da poesia), e em “dobro”, publicando quatro livros: “Equatorial”, “Poemas Árticos”, “Poesia Criacionista” e “Três Novelas Imensas”. A tradução é de Nina Rizzi. Em sã consciência, quem pode deixar de ler? Ninguém, é claro. Estou na primeira fila para comprar, ler e divulgar o bardo do país cujo mapa lembra o político pernambucano Marco Maciel. Devo ler também “Huidobro — La Marcha Infinita” (Ediciones Bat, 303 páginas), de Volodia Teitelboim. Meu exemplar, adquirido num sebo da Plaza Itália, em Buenos Aires, tem dedicatória do autor para Elias Kaminky, datada de setembro de 1994: “Aquí va la vida de um poeta desmedido, com a la simpatia de Volodia Teitelboim”. Curiosamente, acrescenta o telefone, o que sugere que o beneficiário do autógrafo era seu amigo ou, quem sabe, um jornalista.
A Guerra Civil Espanhola, de 1936 a 1939, é considerada como uma das últimas guerras românticas. De romântica, na verdade, tinha pouca coisa. Mas muitas pessoas foram lutar na Espanha, contra o fascismo e a favor do comunismo (visto, na época, como símbolo da liberdade, o que não era. Ressalve-se que, ao lado dos comunas, haviam socialistas, anarquistas e democratas), de maneira realmente romântica — inclusive alguns profissionais da Imprensa. Mas a vida era dura — e um dos jornalistas, George Orwell, chegou a ser ferido (seu “Lutando na Espanha”, Editora Globo, é indispensável). A história é contada no livro “Idealistas Bajo las Balas — Corresponsales Extranjeros en la Guerra de España” (Debate, 539 páginas, tradução de Beatriz Anson e Ricardo García Pérez), do historiador Paul Preston. Orwell e Hemingway são as figuras mais conhecidas, mas Preston apresenta vários correspondentes, como Frank Hanidhen e, entre outros, Louis Fischer. Hanighen escreveu que “quase todos os jornalistas que estiveram na Espanha se tornaram pessoas diferentes” depois da cobertura das batalhas.
Quando vejo um livro sobre a Segunda Guerra Mundial, costumo pensar: “Puxa, mais uma obra; entretanto, tudo já foi dito”. Na verdade, não foi. “Depois de Hitler — Os Últimos Dias da Segunda Guerra Mundial na Europa” (Bizâncio, 444 páginas, tradução de Clara Alvarez), de Michael Jones, é uma prova disso. Li 125 páginas e parei para ler outros livros. Em 2019, se o bom Deus der tempo luminoso e saúde, voltarei à leitura. A obra faz uma análise mais nuançada sobre a violência dos soviéticos na Alemanha.
Entra na minha lista, pela porta da frente, “Combatientes en la Sombra — La Historia Definitiva de la Resistencia Francesa” (Taurus, 645 páginas, tradução de Federico Corriente), de Robert Gildea. Em termos de história, nada é definitivo, mas o livro do professor de Oxford me parece denso e consistente.
Nicholas Ray, Raoul Walsh e Howard Hawks
Para descontrair, devo ler três livros sobre três diretores de cinema que admiro: “Nicholas Ray — Más Grande que la Vida” (Ediciones JC, 285 páginas), de Carlos Benpar, “Howard Hawks” (Ediciones JC, 253 páginas, tradução de Antonio Weinrichter), de Robin Hood, e “El Cine en Sus Manos” (Ediciones JC, 366 páginas, tradução de Francisco Delgado), de Raoul Walsh. Ray tornou-se cult na Europa e, quiçá, no Brasil. Hawks, em termos de western, é um dos grandes rivais de John Ford. Talvez seja um pouco mais poeta e menos moralista. Raoul Walsh deu-se bem no faroeste e no drama, como Hawks (que Faulkner adorava).
Se a trombofilia e o anticoagulante Marevan permitirem, em termos da prosa patropi, lerei tudo de Ronaldo Correia de Brito (autor que leio cada vez com mais prazer), Cristóvão Tezza, Milton Hatoum, Alberto Mussa e Miguel Sanches Neto. A obra “Explorações no Tempo — Memórias” (José Olympio, 226 páginas), de Cyro dos Anjos, será lida. Espero. Na minha lista — quase uma enciclopédia — incluo o romance “As Voltas do Mundo” (Kelps, 424 páginas), de Jailton Batista. Trata-se de um prosador de amplos recursos, autor de outro belo romance, “Duas Mulheres, Quatro Amores e uma Guerra Civil” (a história se passa em Angola).
Querem um livro de poesia extraordinário? Eis: “Matadouro de Vozes” (7 Letras, 93 páginas), de Ronaldo Costa Fernandes. Ora, se já li, por que estou citando? Porque a poesia do autor é para ser lida, relida, trelida e quatrilida. Encanta-me a poesia rebelada de Angélica Freitas (Oswald de Andrade não dormiria antes de ler sua poesia).
Dá para não ler “Um Bárbaro no Jardim” (Âyiné, 367 páginas, tradução de Henryk Siewierski), do bardo polonês Zbigniew Herbert? Espero que os ensaios sejam tão bons quanto sua poesia. “Campos de Castela” (Caminhos, 248 páginas, tradução de Sérgio Marinho), de Antonio Machado, é leitura imprescindível.
Como boxe é a sétima arte (cinema é, vá lá, a 666ª) — tanto que Joyce Carol Oates escreveu um belo livrinho sobre a nobre arte (MMA é assunto de plebeus que não aspiram à nobreza) —, não vou deixar de ler “Ali — A Life”, de Jonathan Eig. O livro sairá, em 2019, pela Record. Muhammad Ali, mais do que mero boxeador, era um artista da palavra e seu corpo não dançava nos ringues — era a própria dança. Venceu o peso-pesado George Foreman, dotado da maior pegada do boxe, dentro e fora do ringue. Em 1974, no Zaire, ao subir ao “palco” para o espetáculo, Foreman estava derrotado. O poder da palavra de Ali o havia destruído de antemão. A palavra gênio deve ser usada para Aristóteles e Einstein. Mas, desculpe-me os que não gostam da aristocracia, devo dizer: Ali era um gênio nos e fora dos ringues. Sua língua era mais ferina e pesada do que os punhos.
Você sabia que a melhor biografia de um poeta português foi escrita pelo brasileiro Adelto Gonçalves, doutor em Literatura? Não fique com vergonha, pois, antes de você, eu fiquei ruborizado por não saber disto por muito tempo. Pois “Bocage — O Perfil Perdido” (Editorial Caminho, 476 páginas) fez (e faz) um sucesso tremendo em Portugal e, infelizmente, não circula no Brasil. Bocage nasceu em 1765 e morreu, em 1805, com apenas 40 anos. As editoras brasileiras estão dormindo no ponto.
P. S.: Provando que a lista é penelopiana, li, em janeiro e antes dos outros, “Eneida”, de Virgílio, na tradução de Carlos Alberto Nunes, a edição da Editora 34, muito bem apresentada e anotada por João Angelo Oliva Neto, professor da USP, e reli “Odisseia”, de Homero, na tradução de Frederico Lourenço, com uma introdução competente de Bernard Knox.
POR EULER DE FRANÇA BELÉM EM LIVROS