ENADE e CPC são a mesma coisa? Não, não são

Ronaldo Mota*

Em qualquer área de atividade, indicadores de qualidade são essenciais para uma permanente melhoria dos serviços prestados, bem como para informar aos usuários que os utilizam. Por mais bem elaborados que eles sejam, os retratos que os indicadores fornecem sempre serão limitados e parciais, sendo tentativas de captar elementos complexos e nem sempre objetivos.

Na educação superior brasileira, há a Lei do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior/SINAES, Lei no 10.861/2014, estabelecendo os marcos referenciais de qualidade. Tendo como referência os indicadores de qualidade, sob responsabilidade do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira/INEP, o processo regulatório é implementado por outros órgãos do Ministério da Educação/MEC.

O Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes/ENADE é previsto na Lei do SINAES para mensurar a qualidade dos formandos e ele é aplicado a cada três anos a uma das três grandes áreas do conhecimento (Saúde, Gestão e Engenharia e Licenciaturas). Os resultados obtidos pretendem ser fotografias das linhas de chegada tentando mensurar, à luz das Diretrizes Curriculares de cada curso, os conhecimentos dos formandos. Além do conceito ENADE de cada curso, cada formando tem acesso à sua avaliação individual, via relatório individual de desempenho, onde ele pode se situar relativamente aos demais formandos de sua turma, bem como comparativamente aos demais formandos de sua carreira no país. Este documento, por lei, é de caráter privativo, mas pode e deve ser amplamente utilizado pelo futuro profissional em todos os contextos em que ele assim o desejar.

Sendo o ENADE uma fotografia na linha de chegada, se ele fosse o único indicador, poderíamos, ingenuamente, concluir que dois formandos com os mesmos resultados tenham tido desempenhos similares. A título de ilustração, se alguém na linha de chegada testemunhar a chegada simultânea de dois atletas, poderia perguntar se ambos saíram do mesmo ponto de partida. A resposta óbvia seria sim. Mas, no caso do ensino superior, a resposta é não. Cada um saiu de um ponto diverso, o qual hoje, grosso modo, pode ser medido razoavelmente pelo Exame Nacional de Desempenho do Ensino Médio/ENEM. Assim, dois atletas chegando juntos, se um saiu de um ponto mais distante, o seu desempenho é superior ao outro que correu menos. Por isso é previsto um outro indicador, o índice que representa o conhecimento agregado pelo curso superior ao aluno (IDD). Neste caso, se o ENADE representa mais adequadamente a qualidade do formando, o IDD diz respeito mais à qualidade do curso em si no seu papel de formar o aluno ao longo da graduação.

Com o tempo, restou evidente que seria aconselhável criar um novo indicador que combinasse esses dois insumos (ENADE e IDD) e incluísse outros igualmente relevantes, tais como a qualificação do corpo docente, incluindo titulação e regime de

trabalho, e uma avaliação pelos formandos das condições oferecidas para o desenvolvimento do processo, incluindo organização pedagógica, infraestrutura etc.

Em 2008, com a participação da Secretaria de Ensino Superior/SESu, da qual eu era o secretário, foi desenvolvido no MEC o Conceito Preliminar de Curso (CPC), com a intenção de ajudar a estabelecer um conceito apropriado a cada curso de graduação, incluindo ENADE, IDD e os demais indicadores. Na mesma oportunidade, foi implantado o Índice Geral de Cursos (IGC), previsto para fornecer um conceito para a instituição como um todo, onde os CPCs resultantes das avaliações dos últimos três anos seriam agregados às avaliações dos programas de mestrado e doutorado.

Na semana passada, o INEP, que realiza avaliações qualificadas, liberou separadamente o ENADE e o IDD e só liberará o CPC em novembro próximo. Assim, temos um hiato onde as especulações podem, eventualmente, levar a conclusões menos embasadas do que elas seriam se ambos, ENADE e CPC, fossem liberados juntos. Por exemplo, conclui-se, somente pelo ENADE, que as universidades federais foram bem melhores do que as instituições do setor privado. Na verdade, o que atesta o ENADE isoladamente é que os formandos das federais obtiveram, em média, notas superiores que os formandos do setor privado. No entanto, visto separadamente, está oculto que os estudantes ingressaram no ensino superior diferentemente, sendo de conhecimento geral que os ingressantes das federais, em média, entram mais bem preparados, fruto de processos seletivos mais concorridos. Quando observados à luz dos CPCs, de fato, as públicas evidenciam, em média, um melhor desempenho, ainda que essas distâncias sejam menores do que as observadas somente pelo ENADE e é visível que as distâncias estão diminuindo.

Sobre IGC, que retrata a qualidade da instituição, interessante observar, a partir dos dados disponíveis de 2015, que de 193 universidades somente 15, todas elas públicas, ostentam o conceito máximo 5, considerado de excelência. Entre as universidades com conceito 4, equivalente a muito bom, temos 18 universidades privadas, sendo que destas somente quatro são com fins lucrativos. A Universidade Estácio de Sá tem o orgulho de ser uma das quatro, especialmente porque fruto de um crescimento sistemático e sustentável.

Enfim, indicadores de qualidade são relevantes, mas há que se tomar extremo cuidado na leitura sobre o que se está efetivamente medindo. Atualmente, temos séries históricas de CPCs e IGCs que permitem aos órgãos do MEC dispor de importantes referências em suas tarefas de regulação e supervisão. Da mesma forma, a sua publicização, na sua forma mais completa, atende ao pressuposto de informar bem ao cidadão sobre elementos de qualidade dos serviços educacionais à disposição no país.

*Chanceler da Estácio