A cena cinematográfica de Roraima vem se consolidando e mais uma vez trouxe orgulho para o estado. Um dos maiores festivais de cinema do país, em sua 53ª edição, premiou uma produção roraimense como melhor filme de 2020. O documentário “Por onde anda Makunaíma” foi o vencedor do Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, na categoria melhor longa-metragem.
A conquista do prêmio principal do Festival veio por unanimidade do júri que analisa as produções. O documentário faz um resgate da origem indígena do personagem que ficou conhecido nacionalmente por meio de Mário de Andrade. Um tema que, inclusive, já foi foco de um trabalho do produtor Thiago Bríglia, da Platô Filmes, que esteve à frente da produção ‘Por onde Makunaíma’, junto com a Boulervard Filmes. “Produzir o ‘Por onde anda Makunaíma?’ permitiu que esse tema tão relevante para a cultura indígena do extremo Norte ganhasse visibilidade numa proporção ainda imensurável, além de oportunizar trocas substanciais para a nossa experiência profissional durante o processo de produção”, observa.
Segundo ele, “o filme aprofunda de maneira muito eficaz os diversos matizes deste personagem icônico do Brasil, enfatizando sua origem na cultura indígena dos povos indígenas do extremo Norte”. Sem contar, ainda de acordo com o produtor roraimense, que valorizará a história de Roraima. “Enquanto produtor, sinto-me feliz em ver esse tema que me move há mais de 15 anos ganhar projeção nacional e internacional, através do nosso filme”, completa, lembrando que fez o documentário ‘Nas trilhas de Makunaima’, em 2007, com a mesma temática pelo Programa DocTV.
A direção do longa é de Rodrigo Séllos e o roteiro de Juliana Colares. Thiago lembra que o filme surgiu exatamente durante um encontro dele com Séllos e Letícia Friedrich, produtora da Boulevard Filmes, quando estiveram em Roraima pela primeira vez, fazendo pesquisas para o projeto de outro filme, ‘Macuxi’.
“Eles ouviram o termo macunaima, diferente do que estavam acostumados, que era macunaíma, e em visita ao Platô Filmes tiveram acesso ao filme produzido em 2007 e dali surgiu uma ideia de parceria”, contou.
E as parcerias não pararam por aí, algum tempo depois eles se juntaram a Collares e juntos conseguiram captar recursos por meio do Programa de Apoio ao desenvolvimento do Audiovisual brasileiro, realizado pela Ancine. O programa tem uma parceria com o canal Curta, que é um canal de TV por assinatura focado na cultura brasileira.
GRAVAÇÕES
Para fazer um resgate histórico e cultural desse personagem, Thiago conta que as primeiras filmagens aconteceram em Roraima, em diversas comunidades indígenas. “Nós filmamos na terra indígena Raposa Serra do Sol, na comunidade indígena do Barro, na vila do Surumu. Filmamos na terra indígena São Marcos, no Bananal, filmamos na comunidade indígena Paraitepuy, comunidade que fica na base para o percurso ao Monte Roraima, já na Venezuela, com os indígenas Pemon”, lembra.
Saindo do extremo Norte, a produção do documentário viajou para o Rio de Janeiro. Lá, houve gravação com os atores do filme do Joaquim Pedro Andrade, filme que consagrou o Grande Otelo como a cara do ‘Macunaima, herói sem nenhum caráter’. A ideia é contar que foi a partir da obra de Mário de Andrade que aconteceu essa ponte entre o extremo Norte e o restante do Brasil.
“Essa é a obra que todo mundo conhece no Brasil. Um texto literário de Mário de Andrade, criado a partir da leitura do livro do escritor alemão Theodor Koch-Grünberg, que esteve em Roraima entre 1911 e 1913 e registrou o mito, com os Taurepang, com Macuxi, Ingaricó, na tríplice fronteira”, explica.
E para apresentar esse processo, a equipe esteve em São Paulo para gravar na Casa Mário Andrade. “Tivemos acesso aos originais do livro que Mário de Andrade registrou, onde ia fazendo as observações dele para escrever o livro Macunaima. Foi a partir do original de Theodor que Andrade tirou a inspiração para esse personagem que deu uma outra característica totalmente diferente do mito, mas, sim, ele bebeu na fonte do mito indígena, e o filme passa por esse momento”, explica.
O documentário também conversa com os atores da peça de teatro chamada Macunaima, assinada por Antunes Filho. “Gravamos com Carvalho, ator que ficou nacionalmente conhecido como Jamanta, e foi quem fez o Macaunaima no teatro. Gravamos com Joana Fomm, Milton Gonçalves, que fez o irmão de macunaima. Enfim, o filme passa por isso tudo, trazendo a referência indígena como referência dessa construção sobre Macunaima e Makunaíma”, completa.
Thiago Bríglia explica ainda o motivo da grafia Makunaíma, no documentário: “A grafia do filme é “Por onde anda Makunaíma”, com K e acento no í, que contempla tanto o macunaima do mito e o macunaíma, da literatura e do cinema”.
Por fim, o produtor roraimense ressalta que houve a participação de outros profissionais do estado envolvidos no processo de filmagem e produção do filme, como o artista plástico Irmânio Magalhães e Cláudio Lavor, técnico e produtor de trilhas sonoras.
“É uma equipe plural, até tenho usado um trecho da música do Zeca Preto e Neuber Uchôa [onde resiste o caimbé e a nossa história que é feita de pajé e corações de cada canto do país], para sintetizar o que é esse filme: trabalha na temática indígena como matriz, e é produzido por mãos e corações de várias partes do Brasil. É um filme genuinamente roraimense e teve essa grande conquista no primeiro festival em que a gente participou, nada mais nada menos que o grande Festival de Brasília”, comemora.