Ronaldo Mota*
A convite do Congresso Nacional, participei da Audiência Pública promovida pela Comissão Mista que acolhe a Medida Provisória (MP) de iniciativa do Executivo Federal modificando o ensino médio. Como educador, reafirmo minha tendência de valorizar as etapas de esclarecimentos e convencimentos, imprescindíveis ao sucesso educacional. Tais procedimentos conflitam com a figura de MP. Mesmo assim, há que se ressaltar que, no caso, os elementos formais de MP, urgência e emergencial, são atendidos.
O indicador de qualidade mais adotado, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, IDEB, evidencia que, entre os níveis da educação básica, o ensino médio é aquele que está em pior situação. A realidade atual de treze disciplinas obrigatórias em si contribui para limitar ou mesmo impedir que melhores e mais adequadas estratégias no processo ensino-aprendizagem sejam debatidas ou implementadas. Os argumentos para manter como obrigatórios tanto o ensino de artes como o de educação física são plausíveis e respeitáveis. Tanto quanto para filosofia, sociologia, história e geografia. Da mesma forma, como físico, teria pouca dificuldade em apontar os prejuízos e deficiências de um formando do ensino médio que não tivesse tido acesso a um mínimo de física e uma introdução ao raciocínio embasado no método científico. A mesma lógica vale para biologia e química. Enfim, tal caminho argumentativo, definitivamente, não funciona e melhor tratarmos mais de conteúdos e interdisciplinaridades e menos de disciplinas isoladas.
Além disso, Anísio Teixeira apontava, desde a década de 1950, que a educação secundária era excessivamente propedêutica. Priorizava a visão de etapa preparatória a estudos mais aprofundados de nível superior, subestimando o relevante papel de preparação técnica profissional dos jovens para o mundo do trabalho. Nos países mais competitivos e bem-sucedidos, a maioria dos jovens que fazem o ensino médio regular o fazem juntamente com educação profissional. No Brasil, somente 11% adotam tal estratégia. Como está estruturado hoje, a concepção subjacente é de que o ensino médio quase exclusivamente prepara ao ensino superior. Porém, contraditoriamente, menos de um quinto dos jovens vão para as faculdades e menos de 12% da população adulta têm diploma universitário.
O processo ensino-aprendizagem no ensino médio depende de muitos fatores, mas cabe especial destaque às condições de trabalho dos professores que atuam neste nível educacional. Em geral, eles são mal remunerados e os cursos de formação, quando ofertados, não conseguem capacitá-los adequadamente à adoção de metodologias inovadoras e contemporâneas, especialmente quanto ao uso de novas tecnologias no ambiente educacional.
Má qualidade do ensino médio tem também como consequência um parque universitário extremamente limitado na sua capacidade de gerar ciência e inovação que sejam mundialmente competitivas. Seremos reduzidos, cada vez mais, a meros
consumidores de tecnologias desenhadas no exterior e adquiridas via commodities com preços aviltantes, num ambiente de baixa produtividade e de altas taxas de desemprego.
Na Palestra, abordei o tema das tecnologias digitais que permitem explorar um novo cenário educacional em que todos aprendem (não sabíamos disso, pensávamos que somente alguns aprendiam), em que todos aprendem o tempo todo (antigamente a aprendizagem estava circunscrita ao ambiente escolar, delimitando espaços e tempos que, hoje, extrapolam os muros e os tempos da escola) e, por fim, o mais relevante, descobrimos que cada educando aprende de maneira única e personalizada (uma espécie de DNA educacional que caracteriza cada um de nós). Apoiados pela analítica da aprendizagem e por plataformas de aprendizagem, os educadores poderão conhecer muito mais sobre seus educandos, bem como estes sobre si mesmos, propiciando desenvolver trilhas educacionais personalizadas que atendam às características, circunstâncias e peculiaridades de cada aluno individualmente.