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Resistir ao fascismo!

A Advocacia Geral da União (AGU) encaminhou petição ao Supremo Tribunal Federal (STF) buscando interditar, no âmbito dos Estados e municípios, a aprovação de leis que resultem na implantação das regras decorrentes do projeto “escola sem partido”.

A AGU confirma a inconstitucionalidade da proposta e entende que as premissas constitucionais já foram suficientemente esclarecidas a respeito, mas ainda assim iniciativas externas ao  âmbito federal insistem na tramitação dessa suma fascista.

Dois aspectos devem ser destacados.

Primeiramente, é um alívio que a AGU tenha tomado essa iniciativa porque o cenário atual é cada vez mais desolador e favorável à destruição dos vínculos entre escola e democracia.

Mas também é necessário considerar o significado político do que está em andamento. Há um texto claro expresso no absurdo da proposta e há um subtexto nas estratégias de tramitação.

Por que é necessário que a AGU recorra ao STF para barrar um projeto tão claramente inconstitucional?

A resposta pode ser encontrada na própria formulação do “escola sem partido”. Ou seja, em seus propósitos e princípios está explicitado o desdém que nutrem ao Estado de Direito.

Por isso, faz parte da estratégia insistir com a intenção de demarcar que a aspiração a estabelecer um “marco moral de controle docente” cabe também como estratégia de enquadramento de autoridades que têm poder discricionário.

Os formuladores do “escola sem partido” não se valem da autoridade emanada das garantias constitucionais do Estado, justamente porque essas garantias são as que expressam o dever estatal de adequar-se à adjetivação “de direito”.

Preferem um Estado funcional, chamado a tomar partido e a “combater os bons combates”.

É como se essa milícia fascista reeditasse uma das características mais básicas do fascismo italiano, que é a pretensão a estabelecer regras de força que “falem diretamente ao povo” expressando, tal como afirmava Gustavo Barroso no Brasil, que se as autoridades falham cabe àquele que zela pela moral dos cidadãos “de bem” fazer o necessário para “pular” instâncias jurídicas e parlamentos e, assim, fazer acontecer aquilo que denominam como “necessário”.

Em outras palavras, persistem tramitando porque desprezam as regras das tramitações e demonstram que insistirão até que o STF definitivamente institucionalize o “não pode, não deve”.

A respeito do projeto “escola sem partido” já lembramos anteriormente que Michel Foucault afirmava que onde há poder, há contra poder, e que Pierre Bourdieu conclamava resistência aos efeitos de políticas que ameaçavam direitos sociais afirmando que onde há fogos deve haver contrafogos.

Um dos contrafogos mais decisivos neste momento diz respeito aos educadores, que devem insistir com grande resistência na partilha, na elucidação, no esclarecimento, no diálogo, porque o embate entre democracia e fascismo conta com um aspecto no mínimo apavorante.

Historicamente, nos momentos de crise o “prestígio” da democracia declina e propostas como as do “escola sem partido” se apresentam e reapresentam porque colhem os frutos da desesperança social que se abre às “soluções de força”, aos expedientes moralizantes, ignorando sempre as lições da História, mesmo as mais recentes.

Lembremos a origem dessas tramitações.

Foi idealizado pelo advogado Miguel Nagib em 2004 e transformado em texto para projeto de lei pelo deputado Flavio Bolsonaro (PSC-RJ) em 13 de maio de 2014.

Desde então, foram elaborados projetos similares em Assembleias Legislativas de 15 Estados. Já os projetos em âmbito municipal somam 66, em cidades em 22 Estados. Em todas as esferas, apenas nove já foram de fato aprovados.

Com maior gravidade, pelo potencial destrutivo generalizado, tramitou no Congresso Nacional a tentativa de inscrever a proposta no âmbito das reformas constitucionais: na Câmara dos Deputados, a PL 867/205, de autoria de Izalci Lucas (PSDB-DF); e no Senado, a PL 193/2016, de autoria de Magno Malta (PR-ES).

É necessário denunciar o papel que essa insólita tramitação exerce neste momento. Seus protagonistas fazem as encenações que fazem, em todas as cidades em que tramita o projeto “escola sem partido”, lançando uma cortina de fumaça sobre retrocessos significativos que têm destruído os fundamentos da educação pública, em todos os níveis.

O que está em andamento não está restrito àquilo que a AGU quer definitivamente impedir. O que está em andamento é maior em seus efeitos e, ao mesmo tempo, menor, no sentido de que se faz ainda mais rasteiro.

Por Gilberto Alvarez (*)

Diretor do Cursinho da Poli e presidente da Fundação PoliSaber.